terça-feira, 26 de outubro de 2010

Meu Dever

Eu devia escrever mais.
Eu devia comer mais verduras.
Eu devia durmir mais cedo.
Eu devia lavar a louça.
Eu devia parar de fumar.
Eu devia sentir menos medo.
Eu devia chorar mais, ser mais sensível.
Eu devia ser menos sensível também, às vezes.
Eu devia amar mais, ou ter amado quando eu pude.
Eu devia escrever um livro.
Eu devia esquecer as gafes, os tremores e toda a lama que me deixa vermelho de vergonha de mim mesmo.
Eu devia correr na chuva pelado cantando minhas músicas.


Talvez eu devesse parar de ser tão egocêntrico também.
Eu devia escutar mais, e saber melhor quando gritar.
Eu devia me entregar mais. Antes, talvez quando era menos calejado, eu era sem medos, pura alma e paixão, agora parece que tudo tem leis, consciência e ordem.
Eu devia estar em carne-viva, sentir a emoção pura, parar de filtrar significados.


E acreditem, eu sinto falta de chorar. Estar morno é estar pior que no inferno, eu gosto de queimar, quando eu grito de dor eu me sinto vivo.

Eu devia me dar uma chance, sentar sozinho, ler minhas coisas e pensar sobre mim. Acho essencial um estudo de nós mesmos. Existem psicólogos que sabem mais de Freud do que da próprio vida. Alô, absurdo?


Eu devia parar com essa minha mania de grandeza de querer mudar o mundo em um minuto, eu nem sei onde eu vivo cacete, e se eu mudar será o meu mundo. Existem bilhões de visões de mundos diferentes, mesmo que eu pinte o meu de colorido, os que vêm cinza nunca irão ceder. Mas quem disse que eu consigo parar? É como se eu quisesse me autoafirmar a cada momento como uma pessoa diferente, transformadora e especial. Baixa auto-estima, pleonasmo, neorose ou loucura mesmo?

Tudo.


Já confessei meu exagero, não tenho porque mentir agora.

Exagero é arte. Você se encanta porque é lindo demais, se choca porque é feio demais, se lembra porque é diferente demais.

Viva ao exagero.

Eu devia continuar exagerado.

Eu devia...

É o começo perfeito pra qualquer construção plública de ilusão.

sábado, 23 de outubro de 2010

Saudade

Me senti amado, e isso mudou meu dia.

Tinha esquecido de me sentir importante...

Depois de um certo tempo sem amor, todo o carinho que recebemos parece ser chocante.
Nos toca de tal modo, que a raiz do amar te abraça e por alguns segundos você se aquece.

Me sinto um artista dentro de mim mesmo.
Meus olhos são os paparazzi do meu reflexo, e jogar o cabelo vira quase um espetáculo.

As cortinas se abrem.


Um garoto, moreno, gay e estabanado.
Um retrato de outras vidas que viveu, em encarnações presas ao seu próprio tempo. Ele é um personagem de si mesmo, como diria Clarice. Sementes que caem em sua boca, dão indigestão, e ele sem querer vomita a vida.

Por que o meu ódio é minha arte mais amada?


Talvez por ser sincero, talvez por ser a alma em carne viva, e quando se está em carne viva é impossível não impressionar.

É o mundo frio que me faz ser admirado, reconhecido e depois feliz.

Cruel, ser admirado pelo sofrimento. É a ironia do poeta. Não que eu seja poeta, estou longe da arte rimada. Mas lá no fundo sinto que minha alma é poesia, que as entranhas são tortas mas se encaixam, o pulmão escuro porém sincero, o sangue tem espinhos que me despedaçam por viver, toda vez que paro, observo e simplesmente respiro para sentir a vida.


Sinto que loucura é tendência, e fico feliz. Loucura é questionamento. Questionar é se colocar no mundo como pessoa única, errante e amante. A vontade de contagiar o mundo com essa loucura talvez me faça mais feliz ainda, poucas almas conseguem ser contagiantes.

Contagiar é se amar, respirar todo ar ao redor em sincronia, fazer da sua verdade um esconderijo pra quem procura a sua própria.

Eu amo contagiar. Amo ser contagiado. E acima de tudo amo pessoas dispostas a se contagiar com o sangue e a doçura ao redor.

É engraçado como eu amo definir coisas que não sei definir. Minhas definições são estranhas. Mas é o que eu sinto e se arrasta até minha cabeça que eu procuro escrever.

Sendo honesto, ser estranho é minha qualidade preferida.

Viva à estranheza, viva ao contágio e viva às feridas da alma.