Eu devia escrever mais.
Eu devia comer mais verduras.
Eu devia durmir mais cedo.
Eu devia lavar a louça.
Eu devia parar de fumar.
Eu devia sentir menos medo.
Eu devia chorar mais, ser mais sensível.
Eu devia ser menos sensível também, às vezes.
Eu devia amar mais, ou ter amado quando eu pude.
Eu devia escrever um livro.
Eu devia esquecer as gafes, os tremores e toda a lama que me deixa vermelho de vergonha de mim mesmo.
Eu devia correr na chuva pelado cantando minhas músicas.

Talvez eu devesse parar de ser tão egocêntrico também.
Eu devia escutar mais, e saber melhor quando gritar.
Eu devia me entregar mais. Antes, talvez quando era menos calejado, eu era sem medos, pura alma e paixão, agora parece que tudo tem leis, consciência e ordem.
Eu devia estar em carne-viva, sentir a emoção pura, parar de filtrar significados.

E acreditem, eu sinto falta de chorar. Estar morno é estar pior que no inferno, eu gosto de queimar, quando eu grito de dor eu me sinto vivo.
Eu devia me dar uma chance, sentar sozinho, ler minhas coisas e pensar sobre mim. Acho essencial um estudo de nós mesmos. Existem psicólogos que sabem mais de Freud do que da próprio vida. Alô, absurdo?

Eu devia parar com essa minha mania de grandeza de querer mudar o mundo em um minuto, eu nem sei onde eu vivo cacete, e se eu mudar será o meu mundo. Existem bilhões de visões de mundos diferentes, mesmo que eu pinte o meu de colorido, os que vêm cinza nunca irão ceder. Mas quem disse que eu consigo parar? É como se eu quisesse me autoafirmar a cada momento como uma pessoa diferente, transformadora e especial. Baixa auto-estima, pleonasmo, neorose ou loucura mesmo?
Tudo.

Já confessei meu exagero, não tenho porque mentir agora.
Exagero é arte. Você se encanta porque é lindo demais, se choca porque é feio demais, se lembra porque é diferente demais.
Viva ao exagero.
Eu devia continuar exagerado.
Eu devia...
É o começo perfeito pra qualquer construção plública de ilusão.