sexta-feira, 25 de março de 2011

Balé de Ganso.

Eu pensei que sabia brincar.

Os seus dedos grossos seguravam minha mão com força.

O que era aquela força?

Existem motivos pra tantas coisas, existem coisas com tantos motivos.

Eu só queria saber um motivo. Pra uma coisa.

Eu pensei que sabia entender.

Sua escola me reprova a cada cinco minutos.

Eu colo, mas não vejo respostas, cadernos, não vejo nem a pergunta.

Você deixou a lousa em branco. Mais uma vez.

Deixou a sala suja de giz, minha mesa rabiscada com sinais, meu lápis sem ponta, meus i's sem pingo, minha solidão sem acento, meu caderno sem linhas. E minha borracha, não te apaga mais.

Eu pensei que sabia jogar.

Suas cartas estão em branco.

Não tem coringa. Não tem rei. A dama chama Ofélia, se afogou pelo valete. Só o Ás foi ao enterro.

Eu pensei que sabia viver.

Mas só de pensar que eu ainda penso em você, faz-me questionar meu próprio juízo.

É um balé de ganso.

O cisne morreu lembra? Eu não vejo os bonitos. Eu vejo o torto, o manco e o patético, eu vejo o sonso, o rouco, o rato, o anoréxico.

Eu via os doentes. Agora eu vejo os mortos.

E se a morte condena quem respira, estou livre da cadeia da vida. Porque o ar carrega-me pesado, e eu não sei o que é um sussurro sem vão.

O vão imenso, entupido, pecado cego que preenche o que a vida não consegue consumir.

O vão que moro, o vão das coisas simples, o vão do silêncio, da esmola, do tropeçar nas palavras. Um vão de criança, que me mantém fresco fruto fraturado pela força do próprio chão.

Pela gravidade que me derruba de podre, despedaça-me, consome-me. Eu volto ao chão, à raiz.

Essa é a hora que eu abro os olhos e lembro do que eu sabia.

Lembro que não sabia mais.

Lembro dos jogos, da escola.

Lembro que um dia eu fingi que sabia.

Agora não finjo mais.

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